Relato meu sobre o ato de anteontem:
Por volta das nove da manhã, a movimentação em frente ao famoso Hotel Marina já era bastante razoável. A Faixa "o Tibete pode ser salvo" já era exibida no asfalto, enquanto banners muito bem feitos descansavam encostados em carro. Alguns manifestantes se congraçavam, provavelmente amigos e colegas; outros distribuíam as pertinentes faixas pretas, que eram colocadas em braços ou bocas, simbolizando o luto e o silêncio amordaçado das vítimas tibetanas. Sozinho, fiquei por ali, até sermos convocados para a faixa, onde fotógrafos de diferentes órgãos da imprensa registravam o ainda pequeno grupo de manifestantes - com destaque para as crianças que brincavam à vontade, filhos e filhas de quem protestava.
Chegaram mais algumas pessoas e depois de um tempo partimos em caminhada, pontuada por batidas em espécie de bumbo ritual e por um mantra budista. Segurando galhardetes e faixas, espalhados por uns tantos metros, provavelmente passamos a impressão de que éramos mais numerosos. Aqui e ali, alguns aplausos, puxados - por professor de ginástica hehe, pessoas fazendo exercícios em bicicletas de academia - e espontâneos. Uma ou outra manifestação de repúdio - por não estarmos protestando contra a dengue, segundo alguns; por sabe-se lá o que, segundo senhor que passou quase correndo, falando que éramos "malucos". Mas acho que a impressão majoritária foi favorável ao nosso ato, que despertou ao menos interesse na maioria dos transeuntes, que pediam informações e aceitavam os panfletos distribuídos.
Problemas, a meu ver: o ato foi talvez excessivamente budista, o que é até absolutamente natural, por ser o budismo o principal vetor de propaganda da causa tibetana. Poucos são os não-budistas que se preocupam com o Tibete, e isso ficou bem claro no ato, com quase ninguém ignorando os mantras - eu era dos poucos que não sabia cantar hehe... embora você aprenda logo, pois são mantras, acabei ficando calado, seria um tanto festivo se eu cantasse algo que nada significa para mim. Alguns participantes da Falun Gong apareceram, e eles se preocuparam em dar um caráter mais amplo ao evento - em faixas e nos panfletos que distribuíram, lembraram também a perseguição a católicos e muçulmanos na China. Acho que o caminho é esse: não quero restringir as manifestações budistas, de forma alguma - mas precisamos aproveitar as Olimpíadas e repudiar a ditadura chinesa como um todo, comentando também sobre o que sofrem os mais de um bilhão de chineses. Não fazer isso é correr o risco de cair no exotismo que motivou as tais piadas, é facilitar que pessoas não muito conscientes, para usar eufemismo, considerem nossas manifestações uma bobajada esotérica em prol de um povo perdido sabe-se lá onde. A presença de Hare Krishnas no final do ato - nem conheço a doutrina deles, não pretendo em absoluto criticá-la - só ajudou a reforçar esse efeito, na minha opinião. Com aquele estilo festivo deles, protagonizaram uma dança que me pareceu, leigo que sou, um tanto deslocada do espírito de protesto do evento.
Enfim: a festa foi bonita. Que apareçam mais católicos, evangélicos, ateus, socialistas democráticos, conservadores e liberais nos próximos atos. O ato será sempre budista demais enquanto só houver budistas nele! Mas um grande parabéns a todo mundo que apareceu e principalmente a quem perdeu tempo e dinheiro organizando tudo.
Matéria em O Globo sobre o ato. Apareço minimamente na primeira foto, entre banners vermelho e preto.
Por volta das nove da manhã, a movimentação em frente ao famoso Hotel Marina já era bastante razoável. A Faixa "o Tibete pode ser salvo" já era exibida no asfalto, enquanto banners muito bem feitos descansavam encostados em carro. Alguns manifestantes se congraçavam, provavelmente amigos e colegas; outros distribuíam as pertinentes faixas pretas, que eram colocadas em braços ou bocas, simbolizando o luto e o silêncio amordaçado das vítimas tibetanas. Sozinho, fiquei por ali, até sermos convocados para a faixa, onde fotógrafos de diferentes órgãos da imprensa registravam o ainda pequeno grupo de manifestantes - com destaque para as crianças que brincavam à vontade, filhos e filhas de quem protestava.
Chegaram mais algumas pessoas e depois de um tempo partimos em caminhada, pontuada por batidas em espécie de bumbo ritual e por um mantra budista. Segurando galhardetes e faixas, espalhados por uns tantos metros, provavelmente passamos a impressão de que éramos mais numerosos. Aqui e ali, alguns aplausos, puxados - por professor de ginástica hehe, pessoas fazendo exercícios em bicicletas de academia - e espontâneos. Uma ou outra manifestação de repúdio - por não estarmos protestando contra a dengue, segundo alguns; por sabe-se lá o que, segundo senhor que passou quase correndo, falando que éramos "malucos". Mas acho que a impressão majoritária foi favorável ao nosso ato, que despertou ao menos interesse na maioria dos transeuntes, que pediam informações e aceitavam os panfletos distribuídos.
Problemas, a meu ver: o ato foi talvez excessivamente budista, o que é até absolutamente natural, por ser o budismo o principal vetor de propaganda da causa tibetana. Poucos são os não-budistas que se preocupam com o Tibete, e isso ficou bem claro no ato, com quase ninguém ignorando os mantras - eu era dos poucos que não sabia cantar hehe... embora você aprenda logo, pois são mantras, acabei ficando calado, seria um tanto festivo se eu cantasse algo que nada significa para mim. Alguns participantes da Falun Gong apareceram, e eles se preocuparam em dar um caráter mais amplo ao evento - em faixas e nos panfletos que distribuíram, lembraram também a perseguição a católicos e muçulmanos na China. Acho que o caminho é esse: não quero restringir as manifestações budistas, de forma alguma - mas precisamos aproveitar as Olimpíadas e repudiar a ditadura chinesa como um todo, comentando também sobre o que sofrem os mais de um bilhão de chineses. Não fazer isso é correr o risco de cair no exotismo que motivou as tais piadas, é facilitar que pessoas não muito conscientes, para usar eufemismo, considerem nossas manifestações uma bobajada esotérica em prol de um povo perdido sabe-se lá onde. A presença de Hare Krishnas no final do ato - nem conheço a doutrina deles, não pretendo em absoluto criticá-la - só ajudou a reforçar esse efeito, na minha opinião. Com aquele estilo festivo deles, protagonizaram uma dança que me pareceu, leigo que sou, um tanto deslocada do espírito de protesto do evento.
Enfim: a festa foi bonita. Que apareçam mais católicos, evangélicos, ateus, socialistas democráticos, conservadores e liberais nos próximos atos. O ato será sempre budista demais enquanto só houver budistas nele! Mas um grande parabéns a todo mundo que apareceu e principalmente a quem perdeu tempo e dinheiro organizando tudo.
Matéria em O Globo sobre o ato. Apareço minimamente na primeira foto, entre banners vermelho e preto.