quinta-feira, 28 de maio de 2009

Crítica da razão crítica

Qualquer um que já tenha suportado disciplinas de educação em universidade brasileira - ou que tenha cursado Pedagogia propriamente, valei-me o pai - sabe bem que o alfabetizador marxista Paulo Freire(1921-1997) domina absolutamente o campo, aparecendo como um espectro a governar imperioso os destinos dos infelizes vivos submetidos(por obrigação acadêmica ou vestibular mais acessível, não raramente) aos cuidados das suas nem sempre letradas sacerdotisas. Nesses ambientes fantasmáticos, cada e toda palavra da terrestre prosa freireana ganha status transcendente, através de dolorosas operações alquímicas que transformam em pérola embasbacante - o olhar da sacerdotisa é sempre de perpétua epifania - platitudes setentistas que caberiam, se tanto, em About Me de mocinha orkutiana (ao lado de um falso e edificante Shakespeare ou, melhor ainda, Veríssimo filho, tanto faz se verdadeiro) ou rodapé de agenda sindicalista. Pairando sobre a ciência séria(oh!), o freireanismo é o marxismo dos pobres, o gnosticismo roto relegado pela vanguarda do pensamento revolucionário às sãogonçalenses (estabeleça a equivalência para a sua aldeia) várias que se mostram contentes em desempenhar o papel a elas destinado na glosa revolucionária, aguardando animadas o dia em que poderão organizar semanas da consciência negra nos educandários da burguesia racista, excludente e mão aberta. Que tudo isso seja brasílico, só constatação desassombrada; saber do fenômeno também na terra do Obama, por outro lado, é de despertar os maiores decadentismos no mais plácido Pangloss - e é exatamente essa nada auspiciosa informação que trazemos aqui para o nosso eventual leitor, através de excelente texto da sempre impressionante City Journal, a melhor revista high brow em língua inglesa desde sabe-se lá que prisca e idealizada era.

No texto em questão, o sempre solar articulista Sol Stern acompanha rapidamente a importância pregressa e atual de Freire nos cursos norte-americanos de educação e ataca competentemente a tosquíssima teoria(?) pedagógica(??) do comunista pernambucano, mostrando que ela é, antes de tudo - ou mesmo tão e somente - uma prática de doutrinação intelectual, no sentido mais vil e desonesto que a expressão pode comportar. Ao apontar(nos anos 60 e 70 do século passado, já sem originalidade qualquer) um caráter inequivocamente classista na educação das modernas sociedades capitalistas, Freire não faz outra coisa que não pregar a sua substituição por um modelo supostamente crítico, que pretende formar uma consciência autônoma em oposição à imposição da cultura hegemônica capitalista via escolas e universidades - ou seja, é um projeto político disfarçado(ou nem isso: toda educação é política) de processo educacional libertador, libertário. Não por acaso, os professores que se dedicam a aplicá-lo - Stern é pródigo em exemplos, o Brasil mais ainda - acabam sempre recaindo, com mais ou menos rapapés e pretensões científicas, em proselitismo que não vai além de um panfletário socialism(o que quer que isso ainda signifique) is good, capitalism is bad. Qual a diferença disso para a educação burguesa? Ora, é óbvio: socialism is good, capitalism is bad - logo, ensinar isso para um aluno é bom, ensinar o contrário (ou uma terceira ou quarta alternativa) é ruim; e isso são Freire, freireanos e a maior contribuição brasileira à educação estadounidense. Como diria um pedagogo sem preconceito linguístico, É NÓIS!

sábado, 23 de maio de 2009

O rato que ruge

No ano passado, a blogueira cubana Yoani Sánchez ganhou o Prêmio Ortega y Gasset de Jornalismo Digital, honraria a ela concedida pelo prestigioso jornal espanhol El País - mas não pôde receber a comenda, pois sua viagem à pátria-mãe do cárcere ilhéu em que vive foi impedida pela quase cinquentenária nomenklatura habanera, respondendo sem dúvida ao desejo último dos inesgotáveis irmãos Castro, Cérberos máximos do quase mitológico Hades(elísio para uns, horror para outros) caribenho. Distante do céu que lhe confiscaram, restou à alma de Yoani manter o voô turbulento que ainda lhe permitem - o site Generacion Y, atualizado via tropicais artimanhas em lan houses e cibercafés hoteleiros tolerados pelo regime como salamaleque adicional (espécies de jineteras virtuais) para os europeus que compram folclore político e decadentismo urbano com moeda forte. Sofrendo o pão que o burocrata amassou para atualizar uma mera página de oposição ao regime vigente, a internauta mais famosa de Cuba ainda pode se dar por satisfeita - incomodasse via internet os poderes estabelecidos em países outros (ou não) e nossa musa involuntária poderia estar em cela de cadeia ou mesmo acolchoado(?) manicomial, acusada de fofoca virtual ou ensandecimento puro e simples.

Mas a sacanagem libertária tarda, jamais falha: em genial peça publicitária criada para a Sociedade Internacional pelos Direitos Humanos, a seção frankfurtiana da agência Ogilvy mostra o algoz de Yoani, Raúl Castro - e também Chávez e Ahmadinejad - entregando completamente a cuba libre diante da ameaçadora presença de um... Mouse, esse elemento periculoso que tende a ser cada vez mais controlado (e instrumentalizado) pelos facínoras alucinados de todos os cantos. Um humor que você não verá no Gramna - e que a quase totalidade dos cubanos, infelizmente, ainda não verá em lugar algum.

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Um juiz das arábias

Durante um seminário sobre violência doméstica realizado na Arábia Saudita, o magistrado local Hamad Al-Razine afirmou que considera legítimo caso uma mulher seja estapeada pelo marido por "gastar demais" - e ainda fez questão de ilustrar essa refletida e tradicionalista posição com caso hipotético: se certa esposa pretende embelezar-se um tanto e gasta com abaya(veste muçulmana típica, uma das poucas alternativas de vestuário permitidas às mulheres do reino dos Saud) o equivalente a 240 dólares e seu estimado cônjugue "bate no seu rosto como uma reação à sua atitude, ela merece aquela punição". A fala provocou revolta entre as mulheres presentes ao encontro, e uma (sim, do gênero feminino) porta-voz do Centro Nacional Saudita para Direitos Humanos achou pertinente lembrar que "Não é aceitável, é mesmo proibido no Islã bater em uma mulher na sua face ... Não importa o que a mulher faça, o homem não tem direito algum de bater na face de sua mulher sob qualquer circunstância." - com a reiterada expressão "na sua face" deixando em aberto que o sagrado Islã wahabita talvez considere, quem sabe, a possibilidade de uma mulher perdulária receber tapinha não consentido em parte menos visível - qualquer uma, dadas as abayas, hijabs e que tais - da sua anatomia.

Ridículo tragicômico à parte, é importante notarmos algo mais profundo por trás da declaração desastrada: no exemplo do juiz disciplinador, a mulher recebe dinheiro do marido e é punida por gastá-lo impropriamente, quer dizer, gastá-lo excessivamente consigo mesma, em indumentária, alimentando sua vaidade - em fala que sugere bastante claramente que essa esposa hipotética não tem fonte de renda própria, dependendo do suado dinheiro do esposo e portanto absolutamente passível de punição caso não o use como deveria. Levantando essa suposição bastante concreta, não pretendo sugerir aqui que todo relacionamento baseado em dependência do gênero é necessariamente estúpido e fisicamente abusivo - pelo contrário, estou certo de que essas conclusões totalistas nunca couberam e jamais caberão em relacionamentos, sendo absolutamente possível a felicidade e uma convivência respeitosa e sadia em situações nas quais, por varidos motivos, um dos integrantes do casal se dedique exclusivamente a atividades não remuneradas. Apesar disso, me parece inevitável concluir que, se a propriedade privada é elemento fundamental - e é - para a liberdade, inclusive daqueles que não a possuem, também a possibilidade real de independência financeira feminina abre (aliada a leis decentes sobre divórcios e pensões, mais ainda) uma larga via de escape para qualquer mulher que pretenda, numa sociedade dada, escapar aos Al-Razines de todos os cantos - a esposa do exemplo talvez suportasse o tapa porque, afinal, precisaria de 240 dólares no mês seguinte novamente.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Justiça feita: estátua de Che Guevara na Áustria é atacada

Do UOL Notícias:

Uma boa notícia como raramente se vê em nosso blog e qualquer outro que esteja "do lado de cá da civilização", como costuma dizer Reinaldo Azevedo. A estátua do busto de Che Guevara em Viena, Áustria, teve o seu nariz arrancado e ainda recebeu a placa com os seguintes dizeres: "Ernesto Che Guevara - 1928 - 1967 - Terrorista".

Como era de se esperar, houve reações. Os governos de Cuba e Bolívia chamaram o ato de fascista, como de praxe. Mas talvez impressione mais o fato de o próprio UOL Notícias chamar o ato de vandalismo. Para eles deve ser realmente coisa feia macular a memória do comandante do primeiro campo de concentração das Américas, que executava pessoalmente prisioneiros amarrados (alguns dos quais tinham cometido o terrível crime de furtar pedaços de pão) e toda vez que os sacrificava no altar da revolução dizia-se ele mesmo o sacrificado.