sábado, 21 de março de 2009

Free virilha

Para além daqueles centímetros cúbicos cerebrais do clássico-mor orwelliano, o controle sobre o próprio corpo (que não guarda semelhança alguma com a pregação do abortismo sem fronteiras, convenientemente cego para o ente estranho em formação que lhe atrasa o discurso e a vida - e a morte) é um dos últimos refúgios do indivíduo contra o totalitarismo. Por essa característica, é preciso sempre defendê-lo do mais tênue esboço de ameaça, mesmo em ambientes tradicionalmente avessos inclusive a autoritarismos e estatismos bem mais banais que a distopia de Eric Blair - como é o caso dos Estados Unidos da América, cujo simpático estado de New Jersey (Jersey, para Philip Roth, Caio Blinder e outros menos cotados) é o verdadeiro e tardio protagonista desse post.
Por lá, as filhas da revolução americana por pouco não se viram impedidas pelo Estado (e pelo estado também) de adotarem um dos mais bem-sucedidos produtos brasileiros de exportação cultural em toda a nossa história de glórias civilizacionais - a famosa brazilian wax, depilação íntima algo radical que aparentemente faz sucesso até no nada cálido (biquínis diminutos na origem da arte, segundo a historiografia pertinente) nordeste dos EUA. Felizmente, a Comissão de Cosmetologia(!) e Cabeleireiros(!!) de Jersey parece ter entendido que dois acidentes - a justificativa para a proibição - não podem condenar absolutamente uma prática cosmética e comercial - numa interpretação de um arroubo revolucionário pró-livre mercado impressionante, coisa surpreendente mesmo.
Mas não se preocupem, amigos estatistas: haverá o dia em que um acidente - ou uma suspeita de - será suficiente para interessar o Estado em toda e qualquer atividade que um indivíduo possa realizar - inclusive brincar com sua prole em piscininha, recuperando outro clássico anglo-saxão desse nosso blog.

domingo, 15 de março de 2009

Opositor deixa o Vladimir Putin e é internado à força em hospício

Da AFP (UOL Notícias):

Demonstrando mais uma vez que a democracia russa é só para ingleses, americanos, franceses e outros trouxas ocidentais verem, o Kremlin retoma mais uma costumeira prática dos seus tempos áureos soviéticos: internar opositores em hospícios.

Há uma semana, um tribunal em São Petersburgo aceitou a "solicitação" de um centro psiquiátrico para internar Vadim Charuchev, criador e organizador de uma rede de debates na internet com o nome de "V Kontakte" (Em contato), que critica abertamente o regime de Putin. O detalhe mais bonito é que o pobre louco foi internado sem que qualquer diagnóstico fosse feito.

sábado, 7 de março de 2009

Ministério Público, um encosto federal

Você acredita que sacrificar animais, despachar baixas gastronomias pelos cantos da urbe e conclamar finados de moral controversa para desígnios duvidosos não são exatamente coisas espiritualmente engrandecedoras? Acha que um ente chamado Zé Pilintra está mais para etílico mineiro que entidade sobrenatural benfazeja? Recusa-se a enxergar honestidade em adultos protagonizando sacudidelas e saltitos entremeados por urros, infantilismos vocais e batucadas - e sem abadás ou Ivete Sangalo nas proximidades? Cuidado: no Brasil de Molusco e no mundo de Barack, você pode estar cometendo um crime - e em não muito tempo talvez seja tratado por aqui tal qual um molecote revisionista gaúcho pego alimentando um site neonazi qualquer.

Na última quinta-feira, o sempre atuante (que orgulho...) Ministério Público Federal decidiu dar mais um passo na sua gloriosa e já ancestral luta contra os horrores da liberdade de expressão que insistem em se manifestar - qual sobrenaturais zombeteiros - na nossa viçosa terra papagalli: o ilibado órgão defensor de todos nós entrou com uma ação na Justiça contra as redes de tv Record e Gazeta, que exibem programas da Igreja Universal acusados de ofenderem religiões de origem africana - incluindo malignas associações dessas manifestações religiosas com, vejam vocês, termos como "feitiçaria" e "macumba", depreciações notoriamente alheias a essas práticas afro-descendentes. Como pena por tão atrozes comentários, o MPF exige que as redes paguem 13,6 (Record) e 2,4(Gazeta) milhões de reais - além de multas diárias de mais 10 mil dinheiros se insistirem em veicular as tais mensagens inaceitáveis.

Não tenho qualquer simpatia pela igreja do Sr.Macedo, a mais famosa filha do Méier - muito pelo contrário, abomino a sua doutrina da prosperidade e suas consequências (ainda a serem melhor estudadas, tema fundamental e negligenciado) aparentes sobre a população deslumbrada e ignaríssima que compõe a principal clientela do Templo; em mais de um sentido, a bem-sucedida máquina de fazer dinheiro e eleger políticos da Av.Suburbana me parece desde sempre perigo infinitamente maior ao futuro das liberdades no Brasil que as minguantes fileiras das religiões de matriz africana, Átila Nunes à parte. Apesar disso, não tenho como ceder à tentação e trair os princípios desse blog (e meus também, principalmente) e negar à Universal e aos seus bispos o direito de falarem o que bem entenderem sobre as religiões dos orixás, caboclos e quejandos - direito que não anula, antes protege, o direito de resposta daqueles supostamente ofendidos. É da própria natureza das religiões salvíficas (e a precária teologia da Universal é derivação de uma delas, por tosca que seja) assumirem exclusivismos e identificarem como inimigas as crenças (não os fiéis, necessariamente) concorrentes, exclusivistas ou não - e o grau de civilidade com o qual esses repúdios são apresentados é sempre resultado de equação complexa, a ser desvendada por sociólogos, historiadores, teólogos e assemelhados, não uma questão a demandar mediação de ente estatal qualquer.

Ao defender uma (mais uma) restrição aos direitos de expressão baseando-se no politicamente correto e em uma visão new wave do fenômeno religioso, o Ministério Público Federal protagoniza - talvez ainda mais do que Macedo e os dele - uma macabra e perigosíssima dança do capiroto sobre o futuro do Brasil.